A Netflix mergulhou de cabeça no submundo do jogo do bicho com Os Donos do Jogo, série brasileira que chegou ao streaming nesta quarta (29) com clima de superprodução, elenco de peso e uma estética que mistura Game of Thrones, Tropa de Elite e O Poderoso Chefão, só que com sotaque carioca. Mas com o subtítulo “inspirada em fatos reais”, a dúvida é inevitável: afinal, o que dessa trama é real e o que foi pura invenção?
Tudo sobre Os Donos do Jogo
Criada por Heitor Dhalia, a série acompanha Profeta (André Lamoglia), um jovem ambicioso do interior que tenta se infiltrar na alta cúpula do jogo do bicho no Rio de Janeiro. No caminho, ele cruza com Mirna Guerra (Mel Maia) e Suzana Guerra (Giullia Buscacio), irmãs rivais em uma disputa familiar que poderia facilmente ser narrada por Shakespeare, ou por George R.R. Martin.
O elenco ainda tem Juliana Paes, Xamã, Chico Díaz, Otávio Müller e Bruno Mazzeo, compondo o que a própria Netflix chama de uma “máfia tropical”. São oito episódios, já disponíveis na plataforma.
O que é real em Os Donos do Jogo
Apesar de nenhum personagem existir de fato, o universo retratado é bem próximo da realidade. A série é inspirada no verdadeiro império do jogo do bicho, contravenção criada no século XIX que se transformou em um dos pilares do submundo carioca.
Dhalia e sua equipe mergulharam em entrevistas, reportagens e documentos históricos para recriar a atmosfera de poder, hierarquia e corrupção que sustentou o negócio por décadas.
A ideia das famílias que comandam territórios, a existência de uma “cúpula do bicho” e a mistura entre crime, samba, política e futebol são todos elementos que vêm direto da história real, especialmente das décadas de 1970 a 1990, quando nomes como Castor de Andrade, Anísio Abraão David e Capitão Guimarães dominavam a cena.
Personagens inspirados em figuras reais
O personagem Dino, vivido por Raphael Logam, carrega traços do lendário Castor de Andrade, o “rei do bicho”, que era tão influente que financiava escolas de samba, times de futebol e políticos. Já o conflito entre as irmãs Guerra ecoa histórias reais, como a disputa entre Shanna e Tamara Garcia, herdeiras de Maninho Garcia, outro nome famoso do jogo do bicho e ex-patrono da Acadêmicos do Salgueiro.
Mesmo com nomes e rostos diferentes, os arquétipos são os mesmos: o bicheiro de terno branco, o genro ambicioso, a herdeira rebelde, a esposa estrategista. Todos eles aparecem, de alguma forma, na história recente do Rio.
Violência e poder
A brutalidade da série também reflete o que realmente acontecia (e ainda acontece) fora da ficção.
A disputa entre famílias do jogo do bicho gerou décadas de homicídios, atentados e traições. De 1999 a 2007, a guerra entre Rogério Andrade e Fernando Iggnácio teria deixado mais de 50 mortos.
Na série, a violência é constante, mas sempre estilizada, como parte de uma engrenagem de poder.
Samba, política e crime
Outra conexão direta com a realidade é o envolvimento dos bicheiros com o Carnaval e a política. Castor de Andrade foi patrono da Mocidade Independente de Padre Miguel, e muitos contraventores usaram as escolas de samba como vitrine social.
A série traduz isso em cenas exuberantes de desfiles, alianças e festas, mostrando que, no Rio, crime e cultura dançaram lado a lado.
Se você tem interesse em saber mais deste universo e o que de fato aconteceu na trama carioca, recomendamos a série e podcast produzida pelo Globoplay: "Vale o Escrito: a guerra do Jogo do Bicho".
O que é pura ficção
Apesar das referências reais, Os Donos do Jogo não é um retrato literal.
As famílias Fernandez, Saad, Moraes e Guerra são criações originais, e os acontecimentos da trama, assassinatos, alianças, amores proibidos e golpes, foram inventados para dar ritmo e drama.
Heitor Dhalia definiu o projeto como uma “máfia tropical”, que usa a realidade como base, mas sem compromisso documental.
E o jogo mudou
Um toque moderno na narrativa é a introdução das bets e apostas online, mostrando como o crime precisa se reinventar. E sim, isso também tem um pé na realidade, investigações recentes apontam que antigos banqueiros do bicho migraram seus lucros para plataformas digitais.
Real ou não
No fim, Os Donos do Jogo é uma ficção com gosto de verdade. Um retrato do Rio que mistura crime, glamour e herança familiar, tudo embalado em visual cinematográfico e trilha afiada.
A série pode não mostrar nomes reais, mas fala de um Brasil que existe, ainda que escondido atrás dos tamborins.

