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Os Easter Eggs de Kendrick Lamar no Super Bowl LIX 

Conhecido por suas referências e citações nem sempre óbvias, rapper levou uma apresentação carregada se significados ao intervalo mais famoso da TV americana 

11/02/2025 - 14h24min

Atualizada em: 11/02/2025 - 15h44min

Atlântida
Divulgação

Kendrick Lamar esteve mais uma vez sob os holofotes neste domingo (9), quando foi a atração de intervalo mais bem pago da TV americana, o Super Bowl. O rapper, que acabou de receber 5 Grammys por sua diss - termo usado para músicas com insultos que são diretos e indiretos - para Drake, levou ao centro do campo uma performance carregada de significado, política, estética e claro, easter eggs. Ao lado de Samuel L. Jackson, SZA e Serena Williams, Lamar levantou o público nos pouco mais de 13 min de show e trouxe questionamentos sobre o país, tudo isso enquanto Trump estava na plateia.

Muito além de um palco

As referências de Lamar durante o show começaram antes mesmo de o rapper entrar em cena. Na imagem aérea da Arena Caesars Superdome, localizado em Nova Orleans, a projeção da cor vermelha fez a estrutura se assemelhar a um grande botão vermelho, como aqueles que encontramos em desenho animado, e tema comum na briga entre o americano e Drake.

Já no interior, o campo de jogo e palco do espetáculo se transformou em um grande controle de PlayStation, com seus quatro botões: X, triangulo, o quadrado e círculo; deixando claro que ali quem controla o jogo é ele.

A figura americana

Samuel L. Jackson aparece em frente a câmera e se apresenta como Uncle Sam – personagem criado em 1800 para representar a personificação dos Estados Unidos. Kendrick já havia mencionado Tio Sam em seu álbum “To Pimp a Butterfly”, como uma figura sinistra que explora pessoas negras por meio do capitalismo. O ator desempenha o papel de mestre de cerimônias do show. Com a frase “Este é o grande jogo americano” a apresentação começa.

Tem mais GNX por aí?  


A música começa de vez com Kendrick em cima de um carro — um Buick GNX 1987. Esse é o ano em que K. Dot nasceu, bem como uma referência ao seu último álbum intitulado GNX. Além de possuir um dos carros, Kendrick há muito tempo expressa admiração pelo veículo, pois foi levado para casa por seu pai em um Buick Regal, semelhante ao modelo, depois de nascer.

O que veio a seguir abriu uma brecha para os fãs esperançosos de que uma nova versão de seu último álbum chegue em breve com Kendrick cantando a música conhecida como “Bodies” pelos fãs, que já apareceu em pequenos trechos no teaser do disco.

A roupa fala

A roupa do rapper foi pensada por Martine Rose, sua parceria como estilista e designer de longa data. Uma jaqueta de couro azul brilhante estilo universitário, com aplicações brancas e pretas foi a peça central do look. Na frente estava a palavra “GLORIA” (a última faixa do disco GNX), e nas costas havia um logotipo da pgLang, a empresa de comunicações que Lamar administra com o produtor musical Dave Free.

A jaqueta estava cheia de outros easter eggs: nomes de algumas músicas de Lamar bordadas e "G.National" (uma referência ao carro que já falamos por aqui).  Enquanto isso, nos pés mais uma referência ganhou espaço: um par de Nike Air DT Max '96s, o tênis de assinatura do cornerback Deion Sanders. Os DTs são uma silhueta inspirada no futebol americano, o que combina perfeitamente com a ocasião.

O pingente com a letra "a" minúscula que Kendrick usou durante seu show, e que chamou a atenção dos especuladores nas redes, parece fazer referência à pgLang, a empresa de entretenimento que ele fundou com Dave Free em 2020. Apesar disso, algumas pessoas supuseram que poderia ser uma crítica a Drake e uma referência ao verso "a menor" em "Not Like Us". Com o histórico de Kendrick, é possível que o duplo sentido tenha sido pensado para causar essa dúvida mesmo.

Já SZA, parceira da nova turnê de Kendrick, usava uma jaqueta decorada com a palavra "Crybaby", uma referência à sua música de mesmo nome. Seu colar diz "Lana", uma referência à versão deluxe de SOS e seu nome, Solána.

Referências políticas

Uma das imagens mais marcantes da performance foi Lamar cercado por dançarinos negros vestidos de vermelho, branco e azul para lembrar a bandeira americana. As teorias e interpretações para esse momento são muitas, desde que insinuar que a América é construída sobre as pessoas negras a divisões políticas mais evidentes que nunca. K. Dot estava no meio de uma bandeira que era dividida em dois lados, cada um dos quais tinha as costas voltadas um para o outro em determinado momento.

Ao som de “Man at the Garden”, os dançarinos o acompanhavam sob um poste de luz. Assim como com Uncle Sam, foi uma referência ao disco “To Pimp a Butterfly”. No videoclipe de “Alright”, uma música que posteriormente se tornou um hino do Black Lives Matter, Lamar se apresenta em cima de alguns postes de luz muito semelhantes, antes de um policial atirar nele com uma mão em forma de arma. Apesar de ser um hino e sucesso consagrado, a canção não fez parte do setlist e teorias indicam que esta seria uma forma de protesto contra a organização.

A NFL recentemente havia removido “End Racism” (Acabe com o racismo) das zonas finais do campo onde foi realizado o Super Bowl LIX, que haviam sido adicionadas após a onda do movimento BLM. A decisão foi divulgada quando o presidente dos EUA, Donald Trump, confirmou sua presença no evento, o primeiro presidente em exercício a comparecer ao Super Bowl.

"A revolução está prestes a ser televisionada, vocês escolheram o momento certo, mas o cara errado". Essa foi a fala de Kendrick logo após cantar o trecho de “Bodies”, a frase é uma das falas mais icônicas do músico Gil Scott-Heron na luta por direitos negros nos Estados Unidos. Outra possível referência as suas cutucadas políticas que viriam a acontecer durante a noite.

Show dividido em atos

Após "Squabble Up", dando fim ao que seria o “primeiro ato” do show, Tio Sam diz a Kendrick: "Muito alto, muito imprudente, muito gueto. Sr. Lamar, você realmente sabe jogar o jogo? Então fique mais firme!". Parece bem evidente aqui que Kendrick antecipou a reação conservadora branca que se seguiria à sua performance e as músicas audaciosas apresentadas até então.

O Tio Sam então interrompe mais uma vez para questionar o rapper, "Oh, você trouxe seus manos com você, o código de trapaça da velha cultura", enquanto Kendrick canta rodeado de dançarinos vestidos de branco abaixo do poste. O ator passa o set inteiro olhando com desprezo para cada movimento de Lamar e buscando ditar o tom da apresentação.

Ameaçando cantar sua diss que rendeu 5 Grammys na prateleira, Kendrick afirma: "Eu quero cantar a música favorita deles, mas você sabe que eles adoram processar", uma referência a Drake processando sua própria gravadora pela popularidade da track. Mas ainda não é nesse momento que o rapper traz a polêmica ao palco.

Após as canções com a companheira de palco SZA - a outra ex-namorada de Drake -, “luther” e “All Stars”, a personificação americana concorda “É isso que a América quer. Legal, calmo. Você está quase lá, não estrague isso”.

Luzes no público

Em referência aos jogos de vídeo game, no início da apresentação luzes refletiam na plateia demonstrando um carregamento de 0 a 100%. Já no meio do show uma mensagem mais sutil que apareceu advertindo: "Aviso: caminho errado”. Internautas apontam que seria uma referência aos rumos que a nação americana está seguindo, outros apontavam sobre a escolha de Kendrick de cantar ou não canções como “Not Like Us” e “Euphoria”, partes de sua briga com Drake.

Críticas e críticas  
 

No interlúdio que se segue, Kendrick evoca sua música "Wesley's Theory" ao fazer um rap, "Quarenta acres e uma mula, isso é maior que a música." É o que foi prometido aos escravos libertos após a Guerra Civil americana — uma promessa que não foi cumprida.

Quando chega ao ponto alto de sua performance, Kendrick finalmente traz ao público “Not Like Us”, com a fala "Eles tentaram fraudar o jogo, mas você não pode fingir influência" a introdução da track começa, som que muitos duvidaram que ele traria ao palco após o processo de Drake e as acusações que a música carrega.

K.Dot poderia ter apresentado uma versão editada da música e cortado as alegações de "pedófilo certificado". No entanto, ele mostrou que essa não seria a intenção quando olhou diretamente para a câmera e fez um rap citando seu rival, "Diga Drake. Ouvi dizer que você gosta deles jovens". O golpe duplo aconteceu depois que todo o estádio ecoou enquanto cantava "a minor" a plenos pulmões, o que foi possível ouvir até mesmo pela transmissão televisiva.

 
Esse é o momento em que tudo acontece, Serena Williams, que havia rumores de ter namorado Drake no início dos anos 2010 (mais tarde ele insultou o marido dela em um rap de 2022), aparece dançando a diss. A dança que Serena está fazendo é o "Crip Walk", um movimento pelo qual ela foi duramente criticada por fazer em Wimbledon. Na época, os críticos sentiram que a dança glorificava a violência de gangues. De fato, parece extremamente relevante para uma das mensagens do show: a questão de como os negros devem se apresentar em público. A atleta também é original de Compton, região sul de de Los Angeles, de onde Kendrick também é.

Ao fim dos 13 minutos, Lamar traz mais um convidado ao campo: o produtor que tornou de "Not Like Us" real, DJ Mustard. O rapper fechou o show com "tv off", transformando o refrão da música em uma provocação direcionada ao público: “É melhor desligar sua TV agora”, enquanto a mensagem “game over” aparece em luzes na plateia.



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