O Mundo Sombrio de Sabrina (Chilling Adventures of Sabrinachegou na Netflix prometendo reinventar a proposta da série original de comédia estrelada por Melissa Joan Hart, ao mesmo tempo em que incorpora elementos mais dark e de grande sucesso da série Riverdale.

Assistimos – devoramos, na verdade – todos os episódios e agora, vocês podem conferir a nossa crítica para a primeira temporada da série.

o mundo sombrio de sabrina

Sabrina ainda é a filha de um bruxo com uma mortal, criada por suas duas tias e fielmente acompanhada pelo gato preto Salem; namorando Harvey Ros, um mortal, ela precisa equilibrar os dois lados de sua vida.

Mas é até aí que as semelhanças vão: a nova encarnação da personagem originária dos quadrinhos da “Turma do Archie“, escrita por Roberto Aguirre-Sacasa, que também produz a série da Netflix e Riverdale, tem horror, satanismo e um humor levemente mórbido.

O Mundo Sombrio de Sabrina inicia com poucos dias da personagem principal completar seus 16 anos e é nesta data que Sabrina Spellman precisará passar por um batismo na Igreja da Noite e escolher entre o mundo dos mortais e o dos bruxos.

A escolha por uma vida plenamente mágica, porém, significa a renúncia a todas suas conexões com o mundo mortal, namorado e amigos. Sabrina, obviamente, não tem interesse em abrir mão dessa parte de sua vida, e começa a questionar o arcaico (e sexista) sistema de regras estabelecido pela igreja enquanto, nos bastidores, é travada uma guerra por sua alma.

A partir daqui, tem SPOILERS, ok?!

#Protagonista muito bem trabalhada:

A estrela da série com toda certeza é Sabrina (Kiernan Shipka). A atriz, conhecida por interpretar a pequena Sally Draper (Mad Men), brilha em todas as cenas em que aparece em O Mundo Sombrio de Sabrina. Ela consegue nos passar a impressão da  da menina, forte, determinada, empoderada, teimosa, e, por vezes, fragilizada.

Sabrina é apresentada como uma típica adolescente sonhadora, com ideias próprias e que, por ser imatura, comete erros. Ela toma decisões ruins na vida e faz o que todo jovem faria se tivesse poderes mágicos. Teima até conseguir resolver determinada situação, deseja o bem, mas é imprudente e as coisas nem sempre dão certo.

O Mundo Sombrio de Sabrina

#Família Spellmann:

Os Spellmanns são uma família apaixonante e cativante! Com um grupo de atores fortíssimos, me arrisco a dizer que a série é pautada por seus personagens. Os principais destaques, além de Sabrina, são as tias Zelda e Hilda e o primo, Ambrose. A primeira, interpretada de forma genial por Miranda Otto (O Senhor dos Anéis), parece mais fria, rigorosa, devota à Igreja da Noite, preocupada com as regras e com o que os outros acharão da sua família; entretanto, ao longo da série, demonstra ser frágil, amorosa, emotiva e faz de tudo para sua família prosperar.

Já a segunda, vivida por Lucy Davis (The Office) traz uma Hilda excêntrica, espirituosa, carinhosa, que não hesita em ajudar quem for preciso — usando meios duvidosos, inclusive. E Ambrose (que está em prisão domiciliar por tentar explodir a igreja do Vaticano), de forma excêntrica e bem humorada, se mostra um parceiro leal que não hesita em puxar a orelha da prima quando necessário, tornando-se um personagem extremamente cativante.

O Mundo Sombrio de Sabrina#Humanidade em foco:

Um ponto que merece ser elogiado é o desenvolvimento dos humanos, algo que na série antiga sempre foi meio que ignorado, com os personagens aparecendo sem muita história própria. Susie (Lachlan Watson) e Roz (Jaz Sinclair), e o namorado Harvey (Ross Lynch), também ganham destaques. As tramas pessoais dos humanos foi muito boa, pois mostra como a magia afeta todo mundo, direta ou indiretamente. Um exemplo disso, foi a situação de Roz, que teme a possibilidade de ficar cega, como sua avó, descobre que junto da cegueira, herdou uma espécie de intuição — “presente” dado pelas “Treze Bruxas“.

O Mudo Sombrio de Sabrina#Entre o bem e o mal:

A série apresenta o sedutor Nicholas Scratch (Gavin Leatherwood), que forma uma espécie de triângulo amoroso entre Sabrina e Harvey. Feiticeiro estudioso dos ensinamentos do pai da menina, ele parece meio dúbio em suas atitudes, interesseiro, — acredito que não seja total mérito do roteiro, mas, sim, da atuação de Leatherwood — porém, acaba mostrando-se leal aos seus amigos.

Além de Nicholas, Sabrina encontra na Academia de Artes Ocultas as três Irmãs Estranhas (Weird Sisters), órfãs que não gostam dela por ser mestiça. Entretanto, o relacionamento entre elas evolui, não se deixando ser óbvio e caricato, como em “Meninas Malvadas“. Prudence (Tati Gabrielle) é a líder das Irmãs e, naturalmente, ganha mais espaço na produção. Mas, Dorcas e Agatha precisam ganhar falas e personalidade.

O Mundo Sombrio de Sabrina

As três não são as únicas “vilãs” da produção. A professora Mary Wardell/Madame Satã, interpretada de forma magistral por Michelle Gomez (Doctor Who), tem um arco longo, que demora um pouco a ser desenvolvido. Apesar disso, a antagonista — que passa por uma transformação de boazinha para malvada e não hesita em manipular Sabrina.

Ainda assim, quem se faz mais presente na dualidade entre bem e mal é o Sumo Sacerdote Faustos Blackwell, vivido pelo experiente Richard Coyle (The Collection). Uma espécie de “Papa macabro”, ele fala em nome do Senhor das Trevas — sim, o Diabo — e preza pela obediência e conservadorismo dentro de sua Igreja Satânica. Nesse quesito, a série é em referências e trocadilhos bem humorados de frases e itens religiosos — trocando o “sagrado” por “profano”, como em “Bíblia Profana de Satã”. Seu arco é, por vezes, confuso, com muitas cenas sem explicação, daqueles que muito fala e pouco diz. É difícil saber se o Sumo Sacerdote é bom ou mau, ou se ele só tem uma “implicância” com a personagem principal.

O Mundo Sombrio de Sabrina

#O gênero horror, funciona:

Outro elemento de O Mundo Sombrio de Sabrina que é muito bem trabalhado é o horror. Por conta do trailer, tive medo de que a série apostasse em jump scares, que é um recurso simplório, muito utilizado nos filmes de terror, justamente pela pegada mais satânica e demoníaca da série – que também era possível notar no trailer.

Mas graças a Satã (desculpa, piadinha infame), os produtores preferiram colocar o terror da série na narrativa, colocando figuras assustadoras, grotescas e situações verdadeiramente horrorosas, mas sem que isso fosse resumido em um bicho aparecendo gritando na tela. Dentro da proposta do seriado, o horror funciona justamente por não ser forçado ou gratuito, tudo tem uma explicação e serve para que a história avance. E sinceramente, eu tomei alguns — vários — sustos, mas que foram bem construídos na trama.

O Mundo Sombrio de Sabrina

#Salem merecia mais que isso:

Um ponto negativo em O Mundo Sombrio de Sabrina é de que Salem, o gato preto de Sabrina, um familiar, não fala! Depois do teaser mostrando o encontro de Sabrina com Salem eu realmente criei esperanças de que o gato mais icônico da ficção fosse falar e ganhar o destaque que ele merecia. O gato até chega a brilhar nos primeiros episódios, mas depois é deixado de lado e basicamente se torna um figurante que aparece para indicar uma passagem de cena. O showrunner, Roberto Aguirre-Sacasa, justicou: “Quando fizemos a série, ele não fala principalmente pelo tom de terror”, mas disse que Salem pode falar na 2° temporada. Vamos esperar para ver, né?!

O Mundo Sombrio de Sabrina

# Série com um tom crítico:

Com um elenco majoritariamente feminino, a trama consegue apresentar como pano de fundo temáticas importantes e, ainda assim, controvérsias. Entre elas, individualismo, sexualidade, bullying, empoderamento feminino, devoção cega à religião, inclusive, necromancia, ocultismo e orgias. Tanto que mescla assuntos “pesados” com outros bem humorados.

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#Mistérios e casos mal resolvidos:

Uma das falhas de O Mundo Sombrio de Sabrina é que parece esquecer alguns mistérios e casos não resolvidos — como o do Connor — lá no meio da temporada; fatos que nem sequer são citados nos últimos episódios. Ou do caso de Blackwell e Zelda, por exemplo, é um dos elementos que fica perdido no enredo. A produção possui grandes cenas, fruto sem dúvida de seu orçamento, mas que, por vezes, vêm acompanhadas de desfechos previsíveis, ou preguiçosos.

#Clássicos do terror como inspiração:

Como já falamos por aqui, O Mundo Sombrio de Sabrina teria diversas inspirações em clássicos do terror, como “O Bebê de Rosemary“, “O Exorcista“, e outros filmes de terror satânico dos anos 60 e 70. E mostrou-se claramente essa inspiração, no episódio 5 da 1° temporada. É capítulo engarrafado, que se passa todo dentro da mansão dos Spellman. Com uma clara influência de “A Hora do Pesadelo“, os personagens são manipulados por um demônio do sono que invade seus pesadelos. É nesse momento que passamos a conhecer melhor cada um dos membros da família de Sabrina, seus medos, anseios e desejos mais profundos. Uma trama muito bem desenvolvida, e com certeza, um dos melhores capítulos da temporada.

O Mundo Sombrio de Sabrina

O Mundo Sombrio de Sabrina consegue se distanciar da série dos anos 90 com maestria, sem parecer muito forçada por querer ser uma história mais sombria, trazendo elementos de terror, humor e drama adolescente. O desenvolvimento dos personagens é algo incrível e é impossível não se importar com pelo menos alguns deles. A narrativa é bem construída e a trama é muito interessante e moderna, trazendo críticas importantes para a sociedade atual. Os efeitos são simples, porém eficazes e práticos. Existe espaço para melhorar, no entanto. A relação entre alguns personagens precisa de mais coerência, a série precisa aprofundar no seu lado mágico e, é claro, Salem precisa começar a falar e ter o destaque que todos gostaríamos.  E que venha a segunda temporada!

O Mundo Sombrio de Sabrina