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Eu sou uma farsa. Isso mesmo. Desculpe te decepcionar, mas todas as vezes que, após algum texto, alguém vem me dizer que me admira eu só penso que sou uma farsa.
Eu pareço uma pessoa legal, mas às vezes eu penso em sentar no assento amarelo do ônibus e fingir que tô dormindo. Eu pareço legal, mas às vezes eu vejo que a louça tá suja e eu finjo que não vi pra não ter que lavar. Eu pareço uma pessoa legal, mas às vezes eu só penso em mim e nos meus problemas. Eu pareço uma pessoa legal, mas tenho noção de que sou uma das grandes responsáveis pela minha depressão e maior potencializadora dela. Eu pareço legal, mas às vezes eu sou grossa de graça com as pessoas, ás vezes eu tô mal e não tô afim de desejar um bom dia pra quem tá ao meu redor. Mas eu desejo. Mesmo que nem sempre seja de coração. Eu pareço uma pessoa legal, mas às vezes eu sou uma ativista de rede social. Eu quero mudar o mundo, mas continuo parada no mesmo lugar. Eu pareço ser legal mas eu perco a paciência com facilidade. Eu pareço ser legal, mas ultimamente eu não consigo me apaixonar por caras legais e que eu sei que gostam de mim (desculpem por isso, de verdade, me desculpem) só porque eu já me machuquei. Eu pareço ser legal, mas eu falo uma quantidade desproporcional de palavrão e como mais do que precisaria.
Eu pareço ser legal, mas às vezes eu fico a aula inteira mexendo no celular, mesmo sabendo que meus pais pagam a faculdade. Eu pareço ser legal, mas às vezes eu desejo o mal das pessoas que me fazem mal. Eu pareço legal, mas certos rancores me impedem de seguir em frente, mesmo que eu diga que não sou rancorosa. Eu pareço ser legal, mas eu percebi que existe muito de mim nas coisas que critico. Pareço legal mas sou extremamente crítica com os outros e comigo mesma. Eu pareço legal, mas eu não sou tão legal assim. Eu pareço legal e mesmo doando sangue, eu sei que não doo a quantidade de roupas que eu poderia doar, eu sei que não faço a quantidade de caridade que eu poderia fazer, e ainda assim eu quero mudar o mundo. Eu pareço ser legal mas às vezes eu coloco meus interesses na frente dos interesses dos outros. Eu pareço ser uma pessoa legal, mas as vezes eu só tenho grandes quantias de dinheiro e escolho não ajudar alguns moradores de rua. Eu pareço legal mas já atravessei a rua ao ver uma “pessoa suspeita” e me convenci de que aquilo não era racismo ou preconceito, era só precaução porque tá muito perigoso hoje em dia. Eu pareço legal, mas eu já ouvi comentários machistas, racistas e preconceituosos e não me manifestei. Não quis ser a chata da roda. A chata da vez. Eu pareço legal, mas eu soube que uma amiga minha foi abusada por um ex-colega e eu não denunciei ele, ela não denunciou ele e eu temo descobrir que ele tenha feito isso com outra menina e saber que eu poderia ter evitado. Eu não sou essa pessoa legal que eu pareço ser.  Às vezes eu desligo na cara dos atendentes de telemarketing, mesmo sabendo que esse é o trabalho deles. Às vezes eu sou egoísta. Às vezes eu sou preconceituosa. Às vezes julgo as pessoas sem conhecê-las ou julgo as pessoas por achar que conheço elas. Às vezes eu não tenho interesse em ouvir outros pontos de vista: “tô certa e ponto”. Às vezes eu sei que minhas amigas são traídas e escolho esconder delas pra não me meter ou por medo de acabar com a nossa amizade, por puro egoísmo.
Preço legal mas às vezes eu me convenço de que sou outra pessoa, pra encaixar com amores que não encaixam comigo, pra sentir que sou melhor do que, bem, eu mesma e eu sofro porque cada vez que mudo pra agradar alguém ou pra fugir de mim mesma, eu me afasto ainda mais da minha essência. Às vezes eu posto fotos no Instagram porque eu sei que as curtidas vão fazer com que eu me sinta melhor com quem eu sou – e elas não fazem – pelo menos, não a longo prazo. Eu pareço legal e feliz nas redes sociais, mas por dentro eu to com um problemão em casa. Um problemão comigo mesma. Um problemão no trabalho. Por dentro eu tô tentando de todas as formas possíveis, não sucumbir. Aguentar. Resistir. Me amar um pouco mais – e eu até que tô me saindo bem. Eu pareço ser legal, mas às vezes eu não sou legal, nem pros outros, nem pra mim mesma.
A má notícia é que eu sou uma farsa porque eu sou normal (eu não sou esse amontoado de expectativas que colocam em cima de mim). A boa notícia, é que, no fundo, todos nós somos uma farsa. A vida fica muito mais leve quando a gente para de idealizar todo mundo e consegue fazer aquele exercício difícil que é, aceitar as pessoas como elas são – e nos aceitar como somos.
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