tres saudades

Lembro em uma determinada ocasião em que minha mãe foi viajar, eu tinha entre quatro e cinco anos e ela contou que na volta eu falei pra ela que entrava em seu guarda roupa pra sentir seu cheiro, essa foi a primeira saudade que eu senti. Saudade de alguém. Saudade de algo físico e não de um momento ou de uma ocasião especial.

Aos sete anos, depois de chorar compulsivamente após chegar de um passeio da escola, eu descobri que despedidas seriam difíceis pra mim. Meus pais perguntavam em desespero a razão do meu pranto, eu não sabia explicar. Foi o dia em que senti minha segunda saudade. Hoje em uma dessas epifanias que raramente nos ocorrem, eu finalmente consegui entender porque eu chorei. Porque eu fui tão feliz que quando acabou me veio um vazio e um medo de nunca mais me divertir daquela forma (uma espécie de nostalgia). A epifania que me trouxe essa memória aconteceu enquanto eu refletia sobre a vida. Aqueles momentos da nossa vida, entre qualquer fast food comido com pressa e uma conta que temos que pagar no horário de almoço, que paramos pra pensar sobre a felicidade e nossas escolhas, quando a gente lembra de se questionar e de refletir entre uma Coca-Cola já quente e uma consulta médica já reagendada umas três vezes por conta dos nossos compromissos.

A felicidade é um momento que você não quer que acabe, mas acaba. Isso deixa saudade. Pra mim é algo como um daqueles shows que eu sempre esperei pra ver na minha cidade, uma viagem que mudou a minha vida ou o dia em que eu comi pela primeira vez a minha comida favorita. A felicidade é um estado de espírito, ela é tão fantástica que você precisa da tristeza pra entendê-la e você precisa da tristeza pra valorizá-la. Sábios os que conseguem fazer isso. Eu fui feliz naquele momento. Naquele dia. Naquele passeio. E depois acabou. E é normal. Eu só parecia não entender o que era aquele sentimento, mais tarde eu descobri que era a saudade. A saudade me buscou e assustou desde criança.
A terceira saudade que eu senti tinha o nome de morte. Sim. Ela foi a mais difícil pois doeu em mim de uma forma diferente. Primeiro levou o meu peixinho dourado. Logo foi meu avô. Alguns amigos. Meu cachorro. Cada vez que eu esquecia o quanto a vida era frágil, vinha a morte com toda a sua grandeza e sabedoria me lembrar disso.
Na escola aprendemos que substantivos abstratos são todos aqueles que não podemos pegar, como a raiva, o ódio, o amor, a paixão, o medo. A saudade, brilhantemente, é um substantivo concreto. Em mim, ela sempre foi concreta, sempre foi um substantivo sem definição ou muito difícil de definir. A saudade é a compreensão de que os momentos bons acabam e essa sempre foi a minha maior dificuldade: aceitar que as coisas acabam.
Sempre me doeu aceitar que a gente tem pouco tempo aqui, pouco tempo pra entender e perceber que a felicidade é um momento. A gente tem pouco tempo aqui pra descobrir a saudade. A gente tem pouco tempo aqui, e a gente guarda tanta saudade pra pouco tempo. Temos pouco tempo pra descobrir que as pessoas erram, pra descobrir que as pessoas nos decepcionam, que as pessoas falham e que nós falhamos, que nós erramos, que nós decepcionamos as pessoas e que tá tudo bem. Precisamos parar com essa mania insuportável de perfeição.
Nós temos pouco tempo pra descobrir que as pessoas se afastam, seguem caminhos diferentes, morrem e só sobra a saudade. Temos pouco tempo aqui, mas temos tempo o suficiente pra mudar a nossa vida todos os dias. Você pode mudar, mesmo tendo pouco tempo aqui. Nós temos pouco tempo aqui, mas podemos achar um emprego que nos faça vibrar, podemos nos esforçar diariamente naquele exercício difícil que é o amor próprio, naquele exercício difícil que é olhar pra dentro de si e perceber que não podemos procrastinar, deixar pra amanhã. Temos pouco tempo aqui, mas podemos ser criativos, diferentes, revolucionários e felizes. Nós temos pouco tempo aqui, mas podemos despertar coisas boas nas pessoas que passam na nossa vida, é só assim que a vida vale a pena quando nós fazemos os outros sentirem algo. Temos pouco tempo aqui, mas na verdade, meus amigos, na verdade nós temos muito tempo. Nós temos tempo de sobra. Nós temos tempo demais (ele só passa rápido).
É enquanto você espera a sua felicidade chegar dando uma voadora na sua porta que a vida acontece. Nossa única chance de ser feliz é agora. A sua única chance de ser feliz é hoje. Nesse instante. Então guarde as suas tantas saudades dentro da mala de viver e vai em frente.
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