aline opinião pena de morte

Dias atrás discutíamos a repercussão de um texto publicado na Atlântida em um grupo de colaboradoras do ATL Girls. A autora do texto estava deveras chocada com o nível dos comentários dos leitores. Sua produção tinha cunho político, logo ela sabia que o mesmo poderia gerar certa comoção, mas não imaginava que tipo de comoção. E pautada nesta inquietação decidi acessar no detalhe o contexto de sua chateação.

O que li nos comentários daquela crônica eram longe de serem contra-argumentos. Tratando-se de política, imaginei que as pessoas discordariam, desmontariam verdades, questionariam fatos, mas não. O que eu vi foi uma série de ofensas de cunho pessoal àquela que teve a audácia de construir uma opinião – e o pior, teve a coragem de publicá-la. Em uma grande rede de comunicação. “Tragam as tochas, vamos matar essa bruxa, pois ela ousou falar o que pensa!”.

Os comentários iam desde nomes de baixo calão, a desconstrução da profissão da mesma, até desejos de morte. Muitos desejos de morte. Fiquei pensando que atrocidades alguém diria a ponto de me fazer desejar algo tão extremo e irreversível. Estendi a minha pesquisa a outras temáticas. Fui ler sobre futebol, e cheguei no drama Portaluppi, na vitória do Grêmio, no quebra-quebra no Beira-Rio da semana passada, na derrota do Inter. Li tudo sobre os “desencontros” de Fátima Bernardes e sua enquete. Mais morte, entre desejos e ameaças. Até meme era pauta suficiente.

O mais intrigante é que a internet e as redes sociais nos possibilitam um vasto espaço para discussão, o que em tese deveria contribuir para o aprimoramento da construção ou desconstrução argumentativa. Uma grande parcela da população, entretanto, decidiu que isso era a oportunidade que faltava para sentar na cadeira do júri e distribuir sentenças, simplesmente por discordar de pontos de vista. Se Dilma ou Temer, Trump ou Hillary, golpe ou impeachment, groselha ou tamarindo, ovo ou a galinha, em tese, este tipo de opinião não deveria determinar o valor da vida ou caráter de juízo de um cidadão. Deveria determinar apenas como ele vê o mundo, baseado nas fontes de informação que busca, não é?

Ainda assim vejo a raiva sendo distribuída da maneira mais óbvia, através da avacalhação do autor, ao invés da discussão da mensagem dele. Ou ainda, em outras vezes, o repudio desenfreado vem convenientemente disfarçado, com reivindicações infundadas. “Opinião escrota, vocês têm a obrigação de serem imparciais” – não temos. Somos colaboradores de blogs que tem compromisso com informação, e também com entretenimento, então a nossa pauta é livre e pessoal – ainda que passe pela edição. “O patrão mandou, e a massa de manobra obedece” – a maioria de nós é colaborador convidado e escreve por vontade própria, ou seja, somos os nossos próprios patrões. Então veja que não adianta justificar agendas ocultas no nosso discurso, é uma opinião que você pode ou não gostar. E aqui não é defender o politicamente correto, mas lamentar em muitos momentos, a falta da boa educação que aprendemos em casa.

O grande problema da maioria das discussões de hoje, reina na realidade de que não se lê ou ouve o outro querendo entender o que ele pensa. Se lê e ouve querendo responder o que ele pensa. Existe uma atual escassez no interesse de trocar ideias, e fartura no interesse de querer medi-las, polarizá-las. O vulgo matar ou morrer. Opinião virou sinônimo de pena de morte nesta guerra que perpetua nas redes sociais.

O último episódio da série Black Mirror do Netflix –“Odiados pela nação”  faz um panorama muito acurado e inteligente da nossa atitude quanto a opinião alheia. O episódio conta que em um dado momento da história (num futuro não muito distante) a tecnologia é transformada em corte social, usada para LITERALMENTE matar os cidadãos julgados de opinião impopular. O final da história é assustador – [SPOILER AQUI] – todos aqueles que foram juízes, tiverem o mesmo fim daqueles que julgaram – ou seja, mais da metade da população chegou ao seu fim.

O que me parece é que quanto mais a tecnologia evolui e aproxima, a humanidade caminha para a decadência e exclusão. E sozinhos e decadentes, meus amigos, parece mesmo que estamos todos – sem exceção – condenados a morte.

antonianodiva.com.br

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