chuva mari

Sete e dez e eu acordo com o barulho insuportável do meu despertador. Uma chuva cai incessantemente do lado de fora e ainda assim, eu preciso ir pro trabalho. A chuva não deixa de cair só porque eu tenho que sair. Sei que preciso acordar, mas meus olhos simplesmente não me obedecem, é como se alguém tivesse amarrado eles. No terceiro ou quarto “adiar alarme”, percebo o meu atraso e tenho que fazer tudo com pressa, “porque eu não acordei antes?“, penso. Agora não dá pra reclamar, saio de casa já em ritmo acelerado.

Chego, a passos largos, em minha parada. 05, 10, 12 minutos e nada do ônibus. “Geralmente ele demora assim? Ou só agora que to com pressa?” Pouco importa, sigo esperando um ônibus que não chega debaixo de uma chuva que não para. 20 minutos e finalmente consigo pegar o meu ônibus. Entre bitucas mal apagadas e cheiros que a ciência ainda desconhece, consequências de um dia chuvoso nos transportes públicos da cidade, eu consigo subir a escada e passar a roleta.

O ônibus sempre foi uma espécie de igreja, pra mim. Lá, resolvi grandes dilemas da minha vida. Sempre foi um local de profundas reflexões. Talvez eu possa dizer que no ônibus foi onde eu realmente descobri o que era desigualdade social. Enquanto uma estudante dedicada – ou desleixada- se preparava para uma prova dias antes ou horas antes dela acontecer, uma mãe entrava cheia de sacolas, com dois filhos no colo e um embaixo da roleta, porque a passagem não dava pra todos.

Lanço, sem dificuldade, um olhar para fora de mim, onde eu sei que moram as histórias que merecem ser contadas. Afinal, quem somos nós de importante? Não tenho a pretensão de ser insubstituível ou especial pra todo mundo. De fato, não seria nada mal ser especial no coração dos que eu desejo bem. O que eu temo, é o esquecimento, mas, mais do que isso, temo não encontrar o amor (no fundo, acho que todos temem). A morte nunca me assustou, acho burrice temer algo inevitável. Imagino a morte como uma viagem a um lugar desconhecido.

O ônibus também me ensinou sobre a fragilidade da vida, nesses quarenta minutos até chegar ao meu trabalho, passo por três diferentes acidentes de trânsito. Um carro que perdeu o controle e bateu contra um poste, uma garota que atravessou o corredor de ônibus correndo e foi atropelada, um carro que ultrapassou o sinal vermelho e colidiu com outro. A morte nos ensina sobre a nossa pequenez. O mundo não para de funcionar só porque alguém morreu, as pessoas continuam pegando os seus ônibus, acendendo e apagando os seus cigarros, começando e terminando relacionamentos. Pessoas continuam nascendo e morrendo, sorrindo e chorando e com pesar percebo que a vida não te espera realizar os seus sonhos, entenda que o tempo não precisa ser seu inimigo. A má notícia é que o tempo voa. A boa, é que você é o piloto.

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