protesto

Quando alguém fala em protesto, muita gente imagina uma multidão descontrolada, gritando palavras de ordem, sem muitos objetivos definidos. Se alguém fala em “protesto feminista”, muitos vão pensar que o grupo forma um conglomerado de alteradas, desunidas e desorganizadas, tendo chiliques pelas razões mais absurdas que a nossa geração de pseudo-cult já ouviu, enquanto queimam os seus próprios sutiãs. Bem, se você assim como eu, algum dia já pensou assim, você precisa da educação que recebi ontem.

Confesso, fui de curiosa. Queria entender o que efetivamente nós poderíamos fazer, juntas no meio da rua, para promover dias mais serenos para a mulherada. O que encontrei foi uma legião de cabeças pensantes, e não apenas de mulheres, falando sobre temas mais variados e igualmente importantes. A gente falou sobre assédio, sobre estupro. Falamos, obviamente, do estupro coletivo da menina de 16 anos do Rio de Janeiro, e também sobre o estupro nosso de cada dia, aquele que a gente encara no ônibus, no trabalho, na balada, em casa. Lá naquele protesto, falou-se sobre educação, sobre ocupação de escolas e apoio aos estudantes, e conversamos sobre a necessidade urgente de falar sobre gênero nas salas de aula. Gênero e respeito, aqueles que deviam andar de mãos dadas.

Na multidão, vi diversidade. Mulheres negras, brancas, pardas. Mulheres arco-íris. Elas eram gordas, magras, altas, baixas, bem nascidas, desprivilegiadas, raçudas. Garotas que gostam de outras garotas, as que gostam de garotos, vice e versa e tudo que há no meio. Tinha homens engajados, com cartazes contra o fim do patriarcado (AMO!), apoiando a causa. Haviam também outros mais tímidos, e ainda assim, participando. Eu vi todas as idades. Todas. De mulheres maduras a jovens garotas. Teve política, e ainda que com participação mais incidente de um lado do que do outro, o foco era alinhado o tempo todo: “movimento apartidário, vamos manter o discurso livre de partidos”, uma das organizadoras orientava. Até porque, mulher, tem todo tipo de opinião política, e o feminismo não foca na esquerda ou na direita, o objetivo é pra frente mesmo.

No meio da Esquina Democrática de Porto Alegre, vi as gurias gritarem que tomariam as ruas por mais igualdade e representatividade nas discussões. Elas que se uniram a tantas outras em diversos pontos do país, como São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília. E por falar em Brasília, no protesto também se discutiu sobre a nossa representante, a secretária Fátima Pelaes, e sua posição arbitraria de contrariedade ao aborto até em casos de estupro. Talvez muita gente pense que foi radical condená-la em praça pública. Ao passo que muita gente também acha difícil dar a luz à um fruto da violência, e ver tomado de si, o poder desta decisão. No protesto de ontem ouvi relatos doloridos sobre a falta de creches, e a dificuldade de mulheres com filhos arrumarem um emprego. Estas e tantas outras questões, que eu mesma – uma mulher – nunca tinha levantado, questionado, pensado. Protestado.

Ontem eu recebi uma educação. Após a dispersão, me peguei falando com a Joanna Burigo, idealizadora da Casa da Mãe Joanna (=> super recomendo), um projeto de mídia coletiva que se propõe a apresentar e representar a multiplicidade de discursos feministas e todas as questões de gênero. Naquela conversa aprendi tanto sobre a nossa (minha e de todo mundo) contribuição na construção do machismo. A gente trocou ideia sobre o nosso caminho de aprender e educar, e de como este caminho pode ser longo, demorado e chato muitas vezes . E que bem…  se “ser chato” for tentar mudar o mundo para melhor, e torná-lo mais digno para todos, sejamos todos chatos, por favor. E que bom que essa caminhada começou, ali, na Esquina Democrática no sentido do progresso e do respeito. Não sei de que forma poderia ser melhor dar os meus primeiros passos rumo a fortalecer ainda mais esta caminhada.

À todas as pessoas que estiveram no protesto de Porto Alegre, obrigada pela aula de dignidade e democracia. Pelo protesto pacífico, justo e construtivo. Obrigada por mostrarem que juntas somos mais fortes, e que esse papo de que mulher é desunida, é coisa do passado. À todas vocês que na volta do protesto, cruzaram as ruas escuras da capital um pouco mais confiantes, depois de olhar para a colega do lado e dizer “Vamos Juntas!“. À todas vocês que não vão se calar jamais, e que vão sim calar o patriarcado, a misoginia, o abuso, o “fiu-fiu” das ruas. Ruas que aliás, agora são nossas. Avante mulherada!

antonianodiva.com.br

Cobertura “amadora” (e com a melhor das intenções) do protesto, registrado pela representante do ATL Girls através do snapchat antonianodiva:

Instagram ATL Girls