lemonade capaDomingo passado Beyoncé mudou o jogo novamente. A experiência visual promovida pelo álbum Lemonade, exibida pela HBO no dia 24 e disponível no Tidal e iTunes, fez o mundo se comover, se educar, se incomodar, se solidarizar e se encantar com a diva pop, como nunca antes em toda a sua trajetória. A obra de arte criada por Queen B vai muito além de um novo álbum. É um manifesto de sentimentos expressos através de um espetáculo de poesia, narrativa e fotografia atraente. Lemonade nos coloca a pensar, puxa nossas entranhas para fora e o único remédio é entregar-se a cura amarga-e-doce promovida por todas as facetas daquela por trás da limonada. A artista, a ativista, a mulher.

Beyoncé artista

A artista

Em uma era de letras vazias e sentimentos voláteis, acessar a essência de uma artista da magnitude de Beyoncé, provando de sua vulnerabilidade humana, por si só, já configuraria Lamonade como uma das obras mais importantes da década. Mas a coisa vai além. A experiência visual de 1 hora é constituída por uma rica compilação de referencias e metáforas interligadas com uma intrincada teia de temas político-sociais e dilemas existências. Metáforas como, por exemplo, o close da câmera em um vaso Kintsukuroi durante a música “Sandcastles”.  Kintsukuroi é a arte japonesa de “consertar com ouro“, ou seja, reparar objetos quebrados sob a filosofia de que nossas cicatrizes, falhas e imperfeições podem ser belas e enriquecedoras. Referencias, como por exemplo, o visual da cantora na música “Hold up”, interpretado como uma alusão a Oxum – a deusa africana conhecida por ser bonita, benevolente, “portadora da canção, música e dança”, e governanta do “amor e águas doces.” Águas doces… como limonada, sabe?

Além dos efeitos visuais, letras profundas e provocativas. Trilhas musicais que misturam o hip-hop, o reggae, o folk, o rock, promovendo a diversidade musical e o respeito pela dinâmica de cada ritmo. De uma forma ou de outra, seja qual for a sua análise, não se pode negar que Lemonade instiga interpretações que merecem ir além da casca do limão. É impossível absorvê-la sem uma análise profunda (e pessoal) do espectador, coisa que só os grandes artistas conseguem.

Beyoncé ativista

A ativista

Beyoncé já havia dado ao mainstream uma prova do que viria, quando lançou “Formation” na icônica apresentação no Super Bowl, assumindo orgulhosamente a sua origem étnica. Mas Formation era apenas o pontapé inicial. Lemonade foi uma educação. Com figurinos e cenários que remetiam a época da escravidão, cabelos e estampas que destacam o orgulho negro, Lemonade levou a questão racial à décima potencia. Beyoncé apontou o holofote novamente para o movimento Black Live Matters com as mães de Trayvon Martin, Mike Brown e Eric Garner segurando suas fotos, relembrando-nos dos jovens negros que foram alvejados pela violência policial americana. Bey disparou letras empoderadoras para jovens mulheres negras – “os seres humanos mais desvalorizados e desprotegidos do mundo”, como é declarado no clipe “Dont hurt yourself” através de um pedaço do discurso do ativista negro Malcolm X.  Beyoncé Knowles conseguiu construir uma obra engajada, concisa e questionadora, e assim, crescer ainda mais como formadora de opinião e ativista. Seu movimento foi cheio de atrevimento, audácia, esperança, familiaridade e fé. Um movimento necessário, já que as causas discutidas em Lamonade precisam deste tipo de manifesto, notório e transcendente. Daqueles que ninguém consegue ficar alheio. Ardido, como limão e realidade.

Beyoncé mulher

A mulher

Através de Lemonade conhecemos a mulher por trás da diva, da empresa, da marca.  A filha que ama o pai, ao mesmo tempo em que o condena como marido de sua mãe. Conhecemos a bisneta de uma geração de mulheres negras que encontrou resiliência dentro do próprio peito. A esposa insegura, através das incontáveis alusões que o álbum trás sobre a infidelidade do marido Jay-Z. A insegurança daquela que julgamos intocável, em relação ao seu corpo, seu cabelo, seu casamento e seu futuro. Nos solidarizamos com sua fúria, sua loucura, sua redenção e o seu perdão. Quem de nós nunca sofreu tentando perdoar? Lemonade mostrou como a dor e fúria de Beyoncé foram combustíveis para sua grandeza e sua cura (assim como fez Adele). Era como se através de seu mais recente trabalho, Beyoncé estivesse escrevendo sua autobiografia e sua carta de alforria. Ela agora escreveria músicas para ela mesma, gostássemos nós ou não. E nós amamos.

Amamos porque no fim de tudo, o que todos nós queremos é perdurar em meio às amarguras da vida, fazendo delas uma alavanca para um futuro mais doce. Fazendo dos limões, uma limonada. Beyoncé vai seguir sendo admirada não apenas como artista, como ativista, mas como a mulher que (como você e eu) vive nesta montanha russa de sentimentos frente ao amor e a vida. E vai perseverar, querendo muito. Acredito que esta seja a mensagem principal de Lemonade: mudar e prosperar acima de todas as dificuldades.

E para isso é preciso ter coragem – bem, coragem e “hot sauce”:

Beyoncé Hot Sauce

Bow down, bitches.

antonianodiva.com.br

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