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A gente nem se beijou, e eu já estou pensando quem vai levar os nossos filhos para o inglês. Imagino como ele vai pedir a minha mão, ainda que ele nem tenha pedido meu whatsapp. Aliás, bons tempos quando alguém pedia o teu TELEFONE para efetivamente te LIGAR, não é mesmo? O gato mal escolheu os nossos drinks no bar, e num pulinho estamos dentro de uma loja escolhendo tecido para as almofadas da nossa casa nova. Ele sequer me adicionou no Facebook e eu já o adicionei na minha programação do final de semana, no aniversário de 80 anos da minha vó, e no número de “contato de emergência” do meu plano de saúde. Fantasio aquela viagem para Florença, em que ele promete que vai me amar pra sempre. Ahhhh, o Pedro e a Érica adoraram a Itália. Pedro e Érica são os nossos filhos. Aqueles que tivemos juntos dentro minha cabeça, enquanto aguardava o momento em que ele me beijaria pela primeira vez.

Não sei o que acontece com as mulheres. Aliás, permitam-me uma correção. Não sei o que acontece com todas as mulheres que eu conheço, incluindo esta que vos escreve. Possuímos a habilidade, destreza e criatividade de criar relacionamentos imaginários, que deixariam qualquer romancista vitoriano no chinelo. São tramas elaboradas, na mesma proporção que infundadas.  Colocamos o objeto de nossa atração constantemente nas conversas do dia-a-dia, como se ele pertence a nossa convivência constante. “Fulano adora risoto”, a louca comenta com a amiga, “Mas quem é Fulano?”, a amiga pergunta com estranheza – “O futuro pai dos meus filhos”, responde a apaixonada. “Vocês saíram pra jantar quando?” – “Não saímos” – diz ela, e completa “…ainda, não saímos ainda”,  reforçando que o encontro factual é apenas uma questão de tempo. “Então como sabes que ele gosta de risoto?”. “Porque o meu é uma delícia”, responde ela confiante, beirando ao delírio. E assim a gente segue, escolhendo músicas, recitando dedicatórias, planejando aquilo que ainda não foi (ou talvez nunca será).

Nunca te aconteceu? De encarnar Bridget Jones e imaginar um relacionamento?

O que de fato me desconserta é que esta característica é predominantemente feminina. E aqui evite qualquer julgamento de machismo ou feminismo – essa tese é com base no “achismo” mesmo. O que acontece é que dificilmente vejo um barbado imaginando o futuro de um romance, enquanto no clube da Lulu do qual eu faço parte, fazemos este exercício de “faz de conta” o tempo todo. Talvez nossa constante exposição a contos de fada tenha amplificado a nossa capacidade de recriar príncipes encantados ou amores lúdicos. Ou ainda porque os romances imaginários sempre ligam no dia seguinte, baixam a tampa da privada e nos dão sapatos/diamantes/cartas de amor em datas especiais. Ou até mesmo essa brincadeira (ou ilusão, como quiser chamar) seja um test-drive mental. A conclusão é que não se pode distinguir de onde vem essa nossa estranha mania de construirmos sozinhas, histórias que normalmente (normalmente = da arte de ser normal) são a dois. E como dizem por aí, a expectativa sabe ser a mãe da merda.

Como o caso da amiga que mandou um email de “mêsversário” para o affaire, declarando sua alegria pelos momentos divididos naquele mês, com palavras de carinho e afeição, para ter como resposta RES: ‘Isto é um spam?’”. Ela estava comemorando um tempo de relacionamento que só correu pra ela, exclusivamente.  Ou da outra que em meio a um porre com as amigas, manda uma mensagem para o gatinho dizendo “Saudade de nós”, e ele responde “Que nós? Quem é você?” – tendo a certeza que ele guardou o número dela, no mesmo lugar que a lembrança do romance. Quem nunca planejou uma visita, sem ser convidada? Pensou em todos os detalhes de um casamento na praia? E ensaiou a assinatura com o sobrenome alheio? Jogue a primeira pedra aquela que não perdeu um pouco do juízo quando gostou de alguém – “Só eu que nunca fantasiei um relacionamento?” Sim, só você, a @diferentona, exclusiva, coração gelado, rainha da serenidade, guardiã da sensatez. Madre Tereza de Não-Quero-Casar.

E não estou dizendo aqui que esta é uma exclusividade feminina. Mas no último censo que fiz no meu grupo de amizades – com margem de erro de 2 a 3 desvairadas pra cima ou pra baixo – o fenômeno é registrado em maior número entre elas. Gosto de pensar, que apesar de toda insanidade e atrapalhação causada por esse contexto imaginário, essas mulheres, maravilhosas e loucas mulheres, nunca vão deixar de acreditar. Por mais que toda essa doidice tenha um tanto de fantasioso, a bem de verdade, elas acreditam (ainda que neguem) no romance, no amor, no futuro. E isso me enche de esperança. Não porque eu precise casar, ter filhos, ou tenha qualquer tipo de problema em estar solteira. Mas pelo simples fato de que  por piores que sejam as histórias que já vivemos, nós acreditamos deliberadamente num lindo de um final feliz.

 

“O nosso amor a gente inventa

Pra se distrair

E quando acaba a gente pensa

Que ele nunca existiu.”

            CAZUZA

– antonianodiva.com.br 

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