feminism

Passei dois dias dentro da Casa TPM, um evento organizado pela Revista TPM em celebração aos assuntos de interesse de mulher contemporânea. Os temas do evento traziam as questões da nossa relação com consumo sustentável e com a tecnologia. É claro que não demorou muito para assuntos como sexualidade, bullying e preconceito surgirem nos debates, onde personalidades e especialistas (mulheres e homens) foram convidados a opinar sobre o desafio de ser mulher nos dias de hoje. Foi quando me dei conta que eu não quero ser feminista. Eu preciso ser.

O que foi discutido neste evento (que é realizado há 4 anos em uma casa de São Paulo que antigamente era frequentada exclusivamente  por cavalheiros) é que muito embora já temos conquistado muito, existe um caminho longo pela frente na direção da igualdade.

Quando Mônica Moreira (Programa Sem Vergonha), Dra. Carmita Abdo (psiquiatra e sexóloga) Miá Mello (atriz) e Fernando Luna (TPM) subiram ao palco para falar sobre “Amor, Sexo e Tecnologia” ficou claro a presença de amarras (sem erotismo) também na nossa cama.  “Mulheres parem de fingir orgasmos! Deixa o cabra saber que ele trepa mal” disse Mônica Moreira em tom de brincadeira, mas levantando um ponto muito importante sobre nossa submissão (ainda que subconsciente) ao sexo oposto. “Se mulher não goza é frígida, como assim frígida? Será que eles sabem o que estão fazendo? Homem não tem problema nenhum em dizer o que gosta.” adicionou Dra. Carmita, “e se ficarmos quietas não estamos contribuindo, pois eles nunca saberão. Sexo é comunicação”.

Dei-me conta que ainda que no ápice da nossa libertação sexual, com tantos aplicativos e modos de interação, ainda nos mantemos caladas sobre tantos assuntos vitais, como desejo, prazer e satisfação. O mediador abre pra perguntas, e eu disparo a mão pra cima. “O que vocês têm a dizer para mulheres que tem medo de falar abertamente sobre sexo por conta de uma possível reputação?”. “Se te julgarem por conta disso, troca de piroca. Sexo bom é sexo acordado, conversado” – falou Mônica, minha mais nova heroína cabra da peste do Maranhão. Dra Carmita responde mais uma pergunta e pede para responder a minha também – “Queria te dizer para falar de sexo tanto quanto for necessário. A mulher precisa aprender o que gosta e a falar do que gosta. E isso não tem nada de feio”.

O debate “Linchamento Virtual” chamou Milly Lacombe (cantora), Luli Radfahrer (colunista da Folha) Geisy Arruda (dispensa apresentações) e Karina Buhr (TPM).  Geyse Arruda inicia falando sobre o episódio em que ficou conhecida, e dispara “eu queria sim chamar a atenção dos meninos, mas jamais imaginei que passaria por aquilo. Depois veio a humilhação virtual – eu nunca vi tanto ódio”. “A agressão na internet é real, apenas o meio é virtual” alegou Karina Buhr. Milly Lacombe  contou como diariamente sofre ofensas como “mal comida” ou “vagabunda” quando trata de assuntos corriqueiros na internet – “parece que a  frequência sexual da mulher é o que realmente preocupa nas questões, e não a sua opinião. Da onde que toda mulher com opinião é ‘mal comida’ ou ‘vagabunda’?”, disse, usando a presidente Dilma como outro exemplo de xingamentos de gênero. “Perdemos a prática de questionar as ideias, e passaram a julgar o dono da voz. E com a internet tudo ficou ainda mais fácil, já que o anonimato é o refúgio do covarde” – acrescentou Luli, “deixe essas pessoas saberem que eles não ficarão impunes para ver a mudança de atitude”.

No debate “Mulheres e tecnologia: 100% compatíveis” Sônia Guimarães (mulher, negra, sem background militar) contou sobre o desafio de ser a principal pesquisadora do Comando Geral de Tecnologia do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) – “ninguém ouvia as minhas ideias, então ia lá, aplicava-as na minha turma e mostrava que eu estava certa. Nenhum homem precisava fazer isso”. Gabriela Duarte falou de sua trajetória para tornar-se uma das poucas pilotas e operar um Boeing 737, e Diana Assennato, eleita em 2014 pela revista Proxxima a mais inovadora profissional de Comunicação e Marketing do país, falou sobre a importância da voz feminina no ambiente tecnológico da programação. Além dos debates, o evento promoveu apresentações com de Bel Pasce, a mulher que prosperou no Silicon Valley e hoje é uma das principais jovens líderes do Brasil, e Bia Granja, falando sobre mulher e internet, e do momento histórico em que as redes possibilitaram a ampliação das vozes de gente como a gente, ao invés da exclusividade dos veículos de massa,  e passou a dar força à luta das minorias.

A Casa TPM não é um evento feminista, ela é um evento de celebração da mulher – ser humano (teoricamente) igual a todos os outros.  E a importância destes fóruns de discussão, reina justamente sobre a necessidade de tomarmos ação frente a barreiras do universo feminino – e aqui eu não estou falando da tampa do vaso levantada. Mas questões de gêneros que nos impeçam de chegar onde podemos e queremos ou ser quem queremos ou não queremos ser. E essa atitude parte fundamentalmente de nós, mulheres, em dizer para desigualdade de gênero: aqui não passarás. 

Enquanto precisarmos de programas como o “Vamos Juntas” para caminharmos em segurança nas ruas, enquanto ganharmos 30% a menos para os mesmos cargos ocupados por homens, enquanto Malala não colocar livros nas mãos de meninas do mundo todo, ou enquanto ser simplesmente mulher for difícil/desonroso/depreciado, sejamos feministas. Nem feminazi. Nem mal comida. Nem vagabunda. Mas mulheres que não querem privilégios, apenas seus direitos.  Não deixemos que o gaslighting nos cale ou envergonhe.  Eu não queria ser feminista. Queria que meus direitos fossem entregues em minhas mãos como muitos os receberam. Então veja, eu não quero ser feminista. Eu preciso ser.

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